A JUSTIÇA PODE SER CEGA MAS NÃO É SURDA: Argumentos concretos contra a construção da Usina de Belo Monte
Por volta das cinco da tarde desta segunda, 17, a desembargadora Selene Almeida,
do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1) em Brasilia, proferiu sua
tão esperada decisão no julgamento da Ação Civil Pública (ACP) que questiona a
liberação de Belo Monte sem a consulta prévia, livre e informada aos povos
indígenas, como previsto pela Constituição: “Considero inválido o decreto 788
[do Congresso Nacional, que autorizou a usina sem a realização das oitivas] e o
licenciamento ambiental de Belo Monte”.
O voto da Dra. Selene não apenas reafirmou o
posicionamento já adotado pelo TRF1 na primeira avaliação da matéria, em 2006,
como responde às obrigações do país frente a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) e aos questionamentos da Comissão Interamericana
de Direitos Humanos sobre falhas no processo de licenciamento da usina.
De nada adiantou, no entanto, o bom senso e a
lucidez da desembargadora, que por mais de uma hora explicitou os impactos de
Belo Monte sobre as populações do Xingu. O desembargador Fagundes de Deus pediu
vistas do processo, o que pode adiar o julgamento indefinidamente.
Perguntamos então ao Dr. Fagundes: o que mais
precisa ser “visto”, o que não foi entendido, em um processo que tramita desde
2006 na Justiça? Quais as deficiências que lhe dificultam a compreensão de uma
realidade tão cristalinamente exposta pela colega Selene Almeida? O que o motiva
a adiar uma decisão que nada mais é que a garantia do respeito à
Constituição?
A cada dia que passa, Belo Monte vai se
espalhando feito bicho peçonhento. Crescem a violência nas áreas urbanas, as
doenças entre populações indígenas e o desmatamento em toda a região. Belo Monte
está fazendo de Altamira um caos tão insuportável, que as próprias autoridades
municipais e lideranças empresariais, ate então apoiadoras da obra, agora pedem
a revisão de seu licenciamento.
Adiar o julgamento desta e das demais 11 ACPs
contra Belo Monte é se esquivar da obrigação de fazer justiça. É permitir que a
hedionda política do “fato consumado” substitua o cumprimento das leis
brasileiras e de tratados internacionais assinados pelo país. Será esta a
intenção? Esperar que nosso dinheiro, oferecido a Belo Monte pelo BNDES,
construa esta obra ilegal para depois argumentar que não há volta?
Afirmamos aqui nossa admiração pela excelência da
análise da desembargadora Dra. Selene Almeida, nosso profundo respeito pelas
instituições do Judiciário e nossa confiança, ainda viva, em sua independência.
Mas a não-decisão do judiciário acerca das ações referentes a Belo Monte pode
condenar o Xingu à morte. Declaramos que não vamos descansar, não vamos nos
calar, nem vamos esquecer. Jamais. Exigimos justiça, porque nós e as futuras
gerações dependemos dela para sobreviver.
Comentários